quarta-feira, 24 de abril de 2013

"Era bela, mas era coxa..."


Ao contrário de Brás Cubas que não deixou o legado de nossa miséria para outrem, eu, já repeti essa façanha por algumas vezes... Talvez seja por causa da minha índole inclinada ao jogo do flerte e sedução barata sem medir as causas e consequências... Talvez, não sei...

Grande parte dos mortais não sabe a sorte que tem de ser feio. Pois de tal feita, quando alguém simpatiza contigo, já saberia que é por outra razão. Mas isso já foi dito por algum velho sábio safado...

Tanto que a dica é velha, mas precisa ser repetida, de tempos em tempos...

Afinal, existem pessoas que precisam dar um upgrade na sua moral e auto-estima vencida pelas propagandas de gente esbelta e sarada. Isso sim é jogo barato e sujo! Massacre publicitário dos mais vis...

Isso já pode ser o suficiente para saber que, com o passar do tempo, muitas são as razões para simpatizar ou amar alguém nada atraente fisicamente.

Nesse mundo miserável, repleto de homens e mulheres que se movem como sombras em meio a uma vida barata e medíocre, onde belas roupas e carros potentes se somam as faltas de perspectivas e se misturam com os vazios e ocos existenciais tudo isso é uma trapaça e esconderijo que esconde as dores mais viscerais da alma e auto-comiseração não explícita.

Ótimo bancar o psicanalista de araque numa situação dessas e arrematar: “Sou diferente disso” - mas não, não sou, quase ninguém é... Se dizem que não é... é porque também algo a esconder...

Deixemos de lado o que nos agrava como seres humanos e pensemos naquilo que nos suaviza como repetidores duma saga onde muitos outros dessa raça humana já fracassaram ao ponto máximo e foram felizes minimamente...

Qual foi o saldo da sua vida? Essa é a pergunta que creio ser feita no julgamento “post mortem” seja pelo porteiro do céu ou inferno, se é que o céu e inferno são lugares adequados para pessoas cheias de vida ou vazias de vida que não cumpriram a risca o script dado para elas devido as circunstâncias... Lembra o que o Ortega y Gasset disse não é?

Embora isso seja aparentemente fútil é de duma importância extrema ou inevitável a qualquer custo que um dia ou, uma hora outra pensemos no saldo que deixamos dia a dia em nossa caminhada pela nossa própria vida. Bem longe daqueles conceitos de livrecos de auto-ajuda e dos palpites amigos que massageiam o ego, pois muitas vezes é num banco da praça sentando olhando ao seu redor que temos uma epifania moral e sobre o sentido do que somos e queremos de nós mesmos...

Não se engane a vida não torna as pessoas fúteis, elas são culpadas de se tornarem o que são e fazem isso dolosamente sem saber, pois, de tão insanas que são que ficam buscando certezas fajutas em quase tudo e baldando-se as suas incertezas mais capciosas. No fundo seria mesma coisa...

Péssima forma de angariar um patrimônio moral, espiritual e de experiência de vida agir e pensar assim...

Sou obrigado a dar razão para Machado de Assis e preferir a máxima: Era bela mas era coxa...não sobre a fulana, mas sim sobre a vida dessa vez... Salve-se enquanto há tempo!


domingo, 21 de abril de 2013

O peso ou a leveza


"O mais pesado fardo nos esmaga, nos faz dobrar sob ele, nos esmaga contra o chão. Na poesia amorosa de todos os séculos, porém, a mulher deseja receber o peso do corpo masculino. O fardo mais pesado é, portanto, ao mesmo tempo a imagem da mais intensa realização vital. Quanto mais pesado o fardo, mais próxima da terra está nossa vida, e mais ela é real e verdadeira. Por outro lado, a ausência total de fardo faz com que o ser humano se torne mais leve do que o ar, com que ele voe, se distancie da terra, do ser terrestre, faz com que ele se torne semireal, que seus movimentos sejam tão livres quanto insignificantes, Então, o que escolher? O peso ou a leveza?" 

Milan Kundera - A insustentável leveza do ser



terça-feira, 16 de abril de 2013

E tenho dito!



Continuemos depois dum dia cheio e cansativo...

“Sim! Eu sei muito bem de onde venho!
Insaciável como a chama do lenho
Eu me inflamo e me consumo”.




Apropriemo-nos um pouco de Machado:

Confesso que provavelmente escrevo essas linhas para quem sabe cem leitores, ou nem cinqüenta, ou nem vinte, ou quanto muito dez. Dez? Talvez...cinco...

Esse diário trata-se duma obra difusa, na qual eu, Aloprado Alonso, serei o mais livre dos mortais e o mais mortificado dos imortais.

Alguns podem crer e outros descrer no que estiver aqui escrito. Mas eu ainda espero angariar simpatias da opinião alheia. Claro que também aguardo o acinte daqueles que frustrados por sua vida ignóbil terão a acachapante capacidade de apenas afrontar-se e afrontar-me ante ao aqui escrito e dito. Nada mais justo. 
Não quero ser unanimidade, pois como já foi dito pelo mestre Nelson: “Toda unanimidade é burra”.

A obra em si é um apanhado de tudo e mais um pouco que se passa e do que não se passou.

Se te agradar caro leitor; desejo-lhe votos de mais alta estima, e; caso não te agradar, fique com o meu piparote em suas orelhas desde já!

E tenho dito!    


segunda-feira, 15 de abril de 2013

Relatos sobre o desconhecido


Diga, pois, nosso senhor a seus servos, que estão na tua presença, que busquem um homem que saiba tocar harpa, e será que, quando o espírito mau da parte de Deus vier sobre ti, então ele tocará com a sua mão, e te acharás melhor” - 1 Samuel 16:16. 

Já é terça de madrugada e estou escrevendo... No outro lado da janela da cozinha o céu brilha planetas colidem uns contra os outros. Minha cabeça está fervendo e eu estou um pouco desconfortável numa cadeira de design moderno comprada nessas lojas de decoração que vendem quinquilharias desnecessárias. 

Meu cérebro começa a se comportar como um motor que pegou na partida e saiu cantando os pneus em disparada rumo a pensamentos e lembranças. As coisas não são o que parecem. Meus celulares parecem enfeitiçados e ouço sussurrar neles animais e vozes estranhas no voice-message.

Talvez tenha a ver com esse fato:


Nesta noite, na varanda do quarto enquanto fumava um cigarro, de repente, apareceu um vulto no jardim do quintal. Eu apertei a vista e vislumbrei a sombra dum homem me observando. 

Opa, eu pensei, algo de estranho está acontecendo aqui. Fiquei mais alerta depois disso. 

Todos nós deveríamos saber que o trabalho do diabo nunca é totalmente revelado até depois da meia-noite. Foi nesse momento que comecei a pensar sobre porque algumas pessoas se arrepiam quando se deparam com simples relatos sobre essas coisas. Não há o que temer ora bolas... pelo menos não se deveria ter medo do relato.

Pois bem, lá estava aquele vulto misterioso no quintal e de repente o mesmo se moveu na escuridão total e sumiu de vista. 

Tentei ficar calmo e esperar ver se o sujeito voltava, e por um momento eu pensei escutar alguém entrando na casa, mas não poderia ser já estavam todos dormindo... 

Um frio na espinha me fez pensar que era um ladrão, mas resolvi descer e ver qual era a real situação. Desci a escada lentamente com o cinzeiro na mão e fumando mais um cigarro. Passo a passo na escuridão como se também fosse um vulto ou anomalia do outro mundo para quem estivesse ali embaixo.

Apenas duas ou três coisas no mundo são mais aterrorizantes que perceber de repente que você está nu e só: É algo desconhecido que te espera no seu destino.

Ao chegar ao térreo, vi que ninguém estava ali, nem mesmo o yorkshire de estimação.

Só que, mais uma vez eu vi o vulto! Dessa vez ele tinha o tamanho de três homens e estava com um cachorro preto enorme ao seu lado e então eu pensei que diabos é isso?

Para piorar, outra pessoa parece se aproximar pelas minhas costas. Pensei: “Deve ser minha namorada, deslizando furtivamente na escada para me fazer uma agradável surpresa”.

Nesse mesmo instante escutei uma voz grossa me chamando pelo meu nome e a temperatura do ambiente esfriou de repete ou eu gelei! Olhei para o vulto e cadê o vulto? Tinha sumido novamente! Olhei para trás e cadê quem estava atrás? Não era ninguém!

Pensei: “Devo estar paranóico e pinel!” - “Devo ter ficado louco!” Uma onda de incredulidade tomou conta dos meus pensamentos e fui até a geladeira pegar gelo para preparar uma dose de whiskey on the rocks...

Abro a geladeira e do nada vejo uma sombra entre mim e a luz da porta da geladeira aberta. Logo que me viro lá está ele! O vulto! Novamente com seu cachorrão! O meu corpo fica imóvel como estátua com a forminha de gelo na mão por alguns segundos...

Lá estava eu peladão e imóvel gelado e segurando gelo. Irônico não?

Então o vulto indefinível começou a conversar comigo com sua voz grossa e rouca, numa boa sem me pregar susto algum.  

Falou que eu deveria ir num cemitério nesta mesma noite, e jogar uma moeda sobre o tumulo dum fulano de tal.

Ao contrário do que muitos pensam. Não foi nenhum ser com chifres, ou garras nem fedendo a enxofre que estava ali falando comigo. Exceto pela voz de rádio AM fora de sintonia e alguns uivos dos cães da vizinhança estava tudo normal ali na cozinha.

Eu continuei fumando e até perguntei por educação para o vulto se ele queria um dose de Jameson on the rocks. Depois disso o vulto sumiu e já era quinze para meia noite. Eu me vesti peguei o carro e fui ao cemitério.

Quem sou eu para contrariar um vulto que aparece na minha cozinha tão gentilmente não é mesmo?

Quando cheguei  no cemitério conforme as instruções do vulto, eu carreguei minha 45 automática e andei alguns metros pelo pátio do cemitério. Então eu voltei para dentro do carro, pois tinha esquecido de pegar a moeda que havia de jogar no jazigo indicado.

Peguei a carteira para procurar uma moeda, e novamente a voz passou a me interpelar. Por Deus! Pensei: “Alguém está querendo me foder a vida e fez macumba para mim!”

Nesse momento eu fiquei com medo mesmo e resolvi ligar o som do carro bem alto para ver se a voz sumia! Eu precisava de música, precisava de um pouco de ritmo e de barulho. 

Aumentei o volume ao máximo e dei play e começou a tocar:



Só sei que baixei o som logo que o riff da guitarra entrou no solo... e meu coração estava batendo a mil e dentro mim estavam gritando algo como lobos aú aú aúuuu. 

De repente surge através dos ramos de plantas do cemitério um sujeito de gravata borboleta, camisa branca, terno escuro e careca. Era um cara mais ou menos de uns cinquenta anos de idade, que usava um distinto anel de ouro e tocou minha mão de leve. O sujeito me disse com voz firme e olhos fitos no meu rosto sem piscar e sem tomar fôlego, mais ou menos um palmo de distância face a face uma única frase: “Desprezai todos os covardes e todos os soldados profissionais que não ousam lutar, mas brincam; todos os tolos desprezai”.

Depois disso ele se virou e sumiu por onde aparecera.

Logo que ele saiu, eu notei que havia uma moeda caída no chão. Aproveitei que estava precisando duma moeda para cumprir o que o vulto me pedira e fui fazer o que tinha que fazer e voltei para a casa.  Não houve nada de estranho e além da imaginação. Apenas fui lá e joguei a moeda no jazigo e dei no pé.



Prólogo


São Paulo, tarde de abril;

tomando um café sem açúcar com cigarro entre os dedos;

e, pensando que chegou a hora de confessar aos leitores o que é a vida de um mero mortal aos curiosos de plantão com tantas dúvidas sobre mistério da minha real identidade, pois sempre me questionam: “Quem é você cara?”



Eis a resposta que sempre pensei em dar:

Abram-me todas as portas!
Por força que hei-de passar!
Minha senha? Walt Whitman!
Mas não dou senha nenhuma…
Passo sem explicações…

Se for preciso meto dentro as portas…
Sim — eu franzino e civilizado, meto dentro as portas, 
Porque eu neste momento não sou franzino nem civilizado,
Sou EU, um universo pensante de carne e osso, querendo passar,
E que há-de passar por força, porque quando eu quero passar sou Deus!
Tirem esse lixo da minha frente!
Metam-me em gavetas essas emoções!
Daqui pra fora, políticos, literatos,
Comerciantes pacatos, polícia, meretrizes, souteneurs,
Tudo isso é letra que mata, não o espírito que dá a vida.
O espírito que dá a vida neste momento sou EU!

E tenho dito!

Tema de Abertura